A proposta de desestatização dos portos de Santa Catarina foi debatida em audiência pública realizada na Assembleia Legislativa. O plano elaborado pelo governo federal e explicado pelo secretário nacional de Portos e Transportes Aquáviarios, Diogo Piloni e Silva, foi criticado na manhã desta terça-feira (9) pelos representantes das cidades de Itajaí, Navegantes e São Francisco do Sul.
De acordo com o secretário, o estudo ainda está na fase inicial e tem como objetivo reduzir o Custo Brasil, mas sem desconsiderar as questões locais. “A missão é gerar impacto positivo econômico, emprego e renda. A pauta não é de destruição de empregos, mas de geração de oportunidades, com nossos portos organizados em cenário extremamente competitivo com condição de reter as cargas, competindo com terminais de uso privado, mas com capacidade de ampliação e atendimento cada vez maior”, afirmou.
O representante do governo federal citou que a União não tem como garantir isso no modelo atual. “Queremos apresentar até fim de novembro o modelo em consulta pública. Com o contrato de concessão, ficará concreta a possibilidade de investimentos. Os ativos físicos serão reversíveis ao poder público ao final da concessão, ou seja, o porto continua sendo público, mas explorado pela iniciativa privada. Não vamos privatizar o porto, mas a administração dele.”
Presidente da SC Participações e Parcercerias (SCPar), Ricardo Moritz, relatou que a meta do governo estadual é buscar uma solução para os portos delegados para Santa Catarina. “Os desafios dos três portos geram um total de R$ 2,3 bilhões que o estado e o governo federal não têm como fazer. Mas a privatização está descartada. A administração da SCPar é que passa para o agente privado, que terá que fazer os investimentos necessários.”
Críticas
O prefeito de Itajaí, Volnei Morastoni (MDB), foi um dos que refutou a desestatização. “Em 2020, Itajaí arrecadou R$ 16 bilhões em impostos federais. É a 12ª cidade do Brasil em arrecadação e graças ao porto, dos 25 anos da municipalização, foram R$ 25 bilhões e não retornou nem 1% para investimentos no porto.” Na sua opinião, é “perfeitamente possível” ter o porto público com a operação privada, “mas autoridade portuária precisa ser pública”.
O prefeito de Imbituba, Rosenvaldo da Silva Júnior (PSB), citou que o porto local foi privado até 2012 e, desde que passou a ser administrado pela SC Par Porto de Imbituba, o resultado é considerado um sucesso. “Nosso porto gera mais de 1.200 empregos diretos e provavelmente três vezes esse número em vagas indiretas. É a mola mestra da economia da cidade, além de fazer um grande trabalho de responsabilidade social e socioambiental”, argumentou. Para ele, a autoridade portuária precisa ser pública para garantir o equilíbrio dos negócios e manter os interesses públicos.
Maikon Maciel, secretário de Economia, representando a prefeitura de São Francisco do Sul, contou que o porto da cidade representa R$ 44,9 milhões de impostos federais. “A gente tem que olhar o impacto social que [a desestatização] vai causar na cidade. Hoje 75% do ISS do setor portuário correspondem a R$ 3 milhões por mês para o município. Os R$ 35 milhões anuais correspondem a 73% do que gastamos com a saúde pública. Se perdermos isso como é que vamos fazer? O porto é essencial para a cidade, é nosso DNA. Queremos que a cidade participe desse diálogo.”
Paulo Teles Júnior, representando a Intersindical de Trabalhadores de São Francisco do Sul, se disse preocupado. “Essa discussão vem no tom de quando será, não se será. Ninguém parece preocupado se é econômica e socialmente viável. Vai ser feito. O processo começou pelo avesso. Se o governo estadual queria a desestatização deveria ter feito um estudo regional e, se verificasse que as cidades não sofreriam perdas irreversíveis, aí sim deveria procurar o governo federal para fazer a desestatização”, criticou.
João Chaves, presidente da Associação Comercial de São Francisco do Sul, relatou que a entidade está “extremamente preocupada” com o interesse do governo de Santa Catarina de abdicar antecipadamente da sua delegação nos portos. “É um movimento na contramão de Paraná e do Rio Grande do Sul, que conseguiram a prorrogação. A renda média dos trabalhadores formais da cidade é de 3,6 salários mínimos, muito acima da média nacional. Valor diretamente relacionado ao porto público.”
Saul Airoso da Silva, presidente do Sindicato dos Estivadores do Porto de Itajaí, representando a Intersindical dos Trabalhadores do porto, disse ter ficado apavorado com a proposta. “O secretário descaracterizou o porto como se fosse qualquer coisa. E o porto de Itajaí não é qualquer coisa. Foi construído pela população de Itajaí. O porto foi destruído por três enchentes e reconstruído pela cidade.”, avaliou.
O secretário Piloni e Silva reafirmou que o estudo ainda vai se iniciar, mas não há um projeto pronto. “Há um caminho longo pela frente. Vão ser levadas em conta as situações de cada cidade e a arrecadação dos municípios não vai cair. O modelo é para trazer mais cargas para os portos. Não vamos deixar de escutar ninguém e o controle do Estado continuará.”
Primeiro debate
O deputado Volnei Weber (MDB), presidente da comissão mista da Alesc que vai analisar o processo de desestatização dos portos de Santa Catarina, explicou que a audiência é só o primeiro momento de debate sobre o tema. “A comissão vem colaborar para receber sugestões, buscar tirar dúvidas da população, dos envolvidos. A audiência vem para dar oportunidade das pessoas se manifestarem”. De acordo com ele, as sugestões de todos os setores serão apresentadas ao governo do Estado. “O secretário trouxe um modelo, mas não quer dizer que será esse modelo.”
Relatora da comissão, a deputada Ada de Luca (MDB) assegurou que o relatório será pautado no que for apresentado, sem viés político ou interesses privados. “Será com argumentos baseados nos estudos de todos os atores envolvidos. Sabemos da importância dos portos de Santa Catarina para a economia catarinense e para as regiões onde estão situados.”
O deputado Sílvio Dreveck (PP) se manifestou alegando que tem convicção de que existe necessidade de investimentos privados. “O Brasil vem passando por crise sem precedentes de recursos para investimento em todos os setores. O exemplo clássico era o aeroporto de Florianópolis. Em menos de um ano, a empresa [que ganhou a concessão do serviço] nos colocou como exemplo.”