Cerca de 90% da violência física, patrimonial, psicológica e sexual contra idosos é praticada por familiares ou conhecidos das vítimas. A informação foi dada pela titular da 6ª DP da capital, delegada Ester Coelho, durante o 1º Encontro Estadual sobre Cuidados com a Saúde e a Segurança da Pessoa Idosa, realizado na tarde de quinta-feira (23), na Alesc.
“Como está a situação do idoso? Estou decepcionada, não adianta uma delegacia para combater a violência contra o idoso, que vocês não imaginam como tem aumentado o número de idosos vítimas de violência: cerca de 90% da violência é praticada por alguém de sua relação: é filho, neto, sobrinho, dificilmente é alguém de fora”, descreveu a Ester Coelho.
A veterana policial civil contou o caso de uma idosa trancada dentro de casa sem tomar banho há uma semana.
“A família não dava bola e a idosa não deixava a cuidadora trocar a fralda. É caso policial? Tem o abandono da família? Ficamos quatro dias para resolver o problema, não tinha para onde enviar a pessoa. Na delegacia temos psicóloga, mas a idosa não deixava entrar na casa. A família tinha de agir e eles foram lá e deram uma dura, a senhora tinha de obedecer, cuidar da higiene, no fim foi internada porque tinha infecção urinária”, relatou a delegada.
Ester criticou duramente o Serviço de Proteção Especial para Pessoas com Deficiência, Idosas e suas Famílias (Sepredi), vinculado à Secretaria de Assistência Social da capital.
“Aqui em Florianópolis conheço um órgão pelo nome, Sepredi, mas não sei quem são, sei que existem porque não devolvem papel, até hoje não recebi nenhuma resposta, estou aguardando para ver se houve cometimento de crime no caso da idosa”, pontuou a delegada.
Ester defendeu uma abordagem humanizada dos idosos, feita pela assistência social dos municípios para detectar sinais de violência.
“A assistência social tem de ir na casa dos idosos. Não adianta criar mecanismos para a gente dançar, cinema, teatro, se temos os vulneráveis, aqueles que são abandonados e mortos. É por esses que estou aqui na frente pedindo, não posso ser conivente com a irresponsabilidade da nossa sociedade e dos nossos filhos”, disparou Ester.
O representante do Ministério Público (MPSC), Daniel Paladino, também destacou a violência contra o idoso praticada dentro de casa.
“Há muita demanda e nossa aflição é diária. Quando a gente fala em violência contra a pessoa idosa se fala em violência física, patrimonial, psicológica, mas algo que tem uma recorrência muito grande são as violências praticadas contra a pessoa idosa no ambiente familiar: é apropriação indébita, consignações feitas sem o aval do idoso, isso tem sido quase diário e aumentou nos últimos tempos. O estado, a família e a sociedade são responsáveis pelos idosos, então a responsabilidade também é nossa enquanto filhos, netos, não é tudo do estado”, ponderou Paladino.
A violência patrimonial
Ester Coelho enfatizou a recorrência da violência patrimonial contra os idosos.
“Mensagens da internet? Não tenham vergonha de perguntar. Não deem cartão para ninguém, o banco não telefona para ninguém, é tudo mentira. Cartão é da gente, não é para emprestar; não assine nenhum papel, se tiver dúvida tem a Delegacia do Idoso, são 32 no estado todo. Temos uma equipe da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) que presta aconselhamento e serviço de graça às pessoas. Se tiverem dificuldade vão até a delegacia tomar um café, de repente leva um bolinho, vão lá”, insistiu a delegada, que estimulou a denúncia através do Disque 100 e do 180 da Polícia Civil.
Instituições de longa permanência para idosos
Daniel Paladino ressaltou o crescimento das chamadas instituições de longa permanência para idosos (LPIs) em Florianópolis, haja vista o aumento da demanda, uma vez que as projeções apontam que em 2051 teremos duas vezes mais idosos que jovens no país.
“Em 2008 havia 17 instituições de longa permanência em Florianópolis, agora em 2023 são 45. Praticamente triplicou e esse número está aumentando. Essas casas são vistoriadas pela 30ª Promotoria, pela prefeitura, Vigilância Sanitária, Corpo de Bombeiros, enfermagem. Todas essas casas são atendidas pela fiscalização, feita semanalmente, temos um cronograma de vistorias presenciais, todas as terças-feiras”, revelou Paladino.
Segundo o titular da 30ª Promotoria, as instituições são privadas, mas algumas delas são conveniadas com a prefeitura da capital.
“Não temos nenhuma instituição de caráter público, embora o poder público tenha convênios com essas instituições. Hoje temos mais de 100 idosos aguardando pelo chamado da prefeitura”, relatou o promotor, referindo-se a Florianópolis.
De acordo com Paladino, 99% das LPIs são residenciais estruturados, com ambiente seguro, acolhedor e com serviços de qualidade.
“Mas dentro do 1% restante podemos citar problemas de duplo abandono, falta de higiene, ociosidade, estrutura inadequada, documentos vencidos (habite-se), isolamento social, ausência de carinho, apropriações de pensões, falta de assistência médica, idosos amarrados, apesar de que isso é muito raro, só vi um caso e a LPI foi imediatamente fechada”, informou o promotor.
Violência normalizada
O secretário de Saúde de Navegantes, Pablo Sebastian Velho, destacou a violência psicológica e criticou a sua normalização pela sociedade.
“A violência psicológica é normalizada por nós, dizemos ‘isso é coisa de velho’, ‘já está caducando’, são coisas que damos menos atenção e que estão impactando a vida das pessoas”, alertou.
O secretário de Saúde de Navegantes insistiu em ações de prevenção e pediu aos idosos que lotaram o auditório Antonieta de Barros e a Sala das Comissões que disseminem as informações compartilhadas durante o evento.
“Precisamos de campanhas de conscientização, assuntos que não são falados as pessoas não prestam atenção; precisamos criar grupos de apoio aos idosos em situação de risco; treinar cuidadores e familiares; fortalecer os vínculos familiares, sociais e comunitários; cuidar da saúde, respeitar e amar os idosos”, indicou Pablo Sebastian.
A palavra do presidente da comissão
Sergio Motta (Republicanos), presidente da Comissão dos Direitos da Pessoa Idosa, que juntamente com a Escola do Legislativo Deputado Lício Mauro da Silveira, promoveram o encontro, lamentou a violência sofrida pelos mais velhos.
“Não podemos em pleno século 21 aceitar a violência contra a pessoa idosa, queremos e precisamos cuidar daqueles que cuidaram de nós, aqueles que são responsáveis pelo estado de excelência de Santa Catarina. Não vamos aceitar a violência”, avisou o deputado.
Participação expressiva
Além de representantes da prefeitura de Florianópolis e da Polícia Militar (PMSC), prestigiaram o evento grupos de idosos e gestores municipais de Palhoça, Pescaria Brava, Balneário Camboriú, Governador Celso Ramos, São José, Florianópolis, Garopaba, Tubarão, Araranguá e Imbituba.
AGÊNCIA AL
Fonte: Agência ALESC